Se jogar em novas experiências das quais você não faz ideia de qual será o resultado dá muito medo, estamos acostumados a ver o que as outras pessoas fazem, e tentar adaptar ao nosso jeito de fazer, sem nos dar ao trabalho de sairmos da nossa zona de conforto.
Dessa forma, temos a falsa impressão de que estamos progredindo e aprendendo coisas novas.
Não, não estamos.
Eu demorei um certo tempo até perceber isso, as coisas não funcionavam pra mim da maneira que funcionava pras pessoas nas quais eu tentava me espelhar. E porque? Porque eu era diferente delas
Não é preciso ser nenhum gênio pra entender isso, veja bem; se você passou a vida inteira estudando e praticando xadrez pra se dar bem nisso, não é da noite pro dia que você vai virar um prodígio em dança de salão!
Claro que dedicação e comprometimento são bons aliados caso você queira mudar, mas nada disso vai adiantar se você não sair da sua zona de conforto.
É por isso que eu decidi sair da minha.
Este post é um divisor de águas aqui do blog, eu acredito que meus leitores ainda não me conhecem a fundo e não sabem tudo de mim, ter sucesso em algo sem ser você mesmo não é gratificante, então vamos mudar as coisas.
De agora em diante uma nova Priscila vai passar a postar aqui; eu não sei se a essência do blog vai mudar, não sei aonde minhas escolhas vão me levar e o que eu vou querer passar a dividir com o mundo, mas sei que dessa vez, farei da maneira mais honesta possível.
Sabem, eu tenho um segredo, pelo menos aqui. As pessoas que me cercam todos os dias já tem conhecimento, mas no mundo "online", não é todo mundo.
Me custaram 16 anos da minha vida pra descobrir a minha identidade verdadeira; antes disso eu não me reconhecia no espelho. A pessoa que eu era antes, as roupas que eu vestia, o que eu era obrigada a aceitar como conduta social aceitável simplesmente não se encaixavam em mim, foi preciso muita reflexão até eu compreender isso.
Pra quem não pescou ainda o que eu quero dizer, é o seguinte: Eu sou uma mulher trans!
Eu já consigo até visualizar a reação dos leitores, aquele choque momentâneo, aquela vontade de fazer perguntas indiscretas, sobre genitais ou nomes em certidão de nascimento, aquele receio de achar que eu sou um ser extraterrestre, e não saber como eu vivo, ou do que eu me alimento... eu observo a sociedade julgando a população transgênera como sub-humanos, pessoas que não são pessoas o suficiente para serem respeitadas, não importando a aparência.
Essas coisas acontecem comigo o tempo todo, eu conheço gente nova, eu me dou bem ,sou comunicativa e todo mundo quer rir das minhas piadas, no momento em que ficam sabendo que eu sou transgênera, de "pessoa legal que acabou de conhecer", eu passo a "espécime estranho, não identificado, para estudo".
O que eu quero dizer é o seguinte; pra quantas pessoas por aí você sai perguntando sobre os órgãos genitais assim que conhece? Tipo, sério mesmo! Querem um exemplo de um diálogo comigo que acontece muito frequentemente?
-Oi tudo bem, Priscila?
-Tudo, e com você?
-Tudo bem, então, eu fiquei sabendo que você é trans...
-Sim, eu sou.
-Então você é operada? Qual é o seu "nome de verdade"? Você já transou com mulher?
-...
O mais irônico e triste nisso tudo, é que as pessoas a minha volta não veem isso como anormal. É muito mais anormal eu ser diferente do que serem indelicados comigo.
O que as outras pessoas não sabem, é que ser trans não é tão anormal assim... eu conheço muitos meninos e meninas trans, de todas as idades, cores, de todos os cantos do país (até fora daqui), e eles tem vivências parecidas... apesar das classes sociais ou das localizações geográficas serem distintas, essas pessoas passam pelas mesmas coisas que eu, as situações de constrangimento e vergonha que as vezes outras pessoas nos fazem passar sem nem perceber.
Pensando nisso eu resolvi fazer esse post, e começar uma série de posts sobre o tema; o que é ser transgênero, o que é uma mulher trans ou um homem trans, o que é gênero e binarismo, pessoas não binárias, a diferença entre transgêneros e homossexuais, a existência de pessoas trans homossexuais, hormonização, o mito das cirurgias, a infância de uma pessoa trans, etc...
Eu vou tentar explicar tudo da maneira mais simples possível, pra tentar ao menos começar a abrir a mente das pessoas que estão a nossa volta, dispostas a entender que somos como elas, que fazemos parte do todo da sociedade, e pra conscientizar também sobre as injustiças que nos são impostas enquanto somos invisíveis.
Eu quero agradecer aos leitores do blog que me acompanharam até hoje, e pedir desculpas por este post tão importante ter demorado tanto a chegar, mas agora que ele já está aqui, vamos juntos nessa nova viagem!
Quero avisar também que o conteúdo do blog não vai mudar radicalmente. É claro, vão haver posts sérios como esses, com esclarecimento e conteúdo mais formal, mas eu não deixei de ser a Priscila apaixonada por desenho, música, moda, cabelo, maquiagem... tem muito mais disso por vir!
Bom por hoje é só, um beijão pra todo mundo! E paz no coração de todos!